Nabor Nunes Filho (1944-2013)
Nabor Nunes Filho (1944-2013)
Nabor foi filho único, mas parece que herdou todo o talento musical como se fosse destinado a uma família maior.
Aos nove anos ele se tornou organista da então pequena Igreja Batista de Itabaiana. Tinha um excelente ouvido musical e “tirava” as melodias dos hinos na hora.
Aos 13 anos fazia parte da banda de música da cidade, tocando requinta (uma espécie de clarinete pequeno). Foi nesse ano que Nabor fez sua primeira composição.
Nabor completou todo o seu curso primário em Itabaiana e em 1958 entrou no Colégio Americano Batista de Recife, onde completou os cursos ginasial e científico. Durante esses dias houve um acontecimento muito importante na vida de Nabor Nunes. O Pr. David Gomes fez uma palestra no auditório do colégio e Nabor, sentado ao piano, sentiu pela primeira vez que Deus estava tocando em sua vida. Sentiu-se despertado para o ministério. (É mais uma razão, entre incontáveis outras, de dar graças a Deus pelo ministério do Pr. David Gomes.)
Em 1965 Nabor começou a estudar no Seminário Teológico do Norte do Brasil em Recife. Durante seus cinco anos de estudos serviu à Igreja Batista de Cordeiro. Em 1969 recebeu o grau de Bacharel em Teologia, mas havia cursado algumas matérias de música também, especialmente regência e órgão. No mesmo ano foi consagrado ao ministério e casou-se com a médica Dra. Mirian Correia (a qual teve 3 filhos).
Em 1970 Nabor Nunes assumiu o pastorado da 1ª Igreja Batista de Corrente, grande e notável igreja do interior do Estado do Piauí (Veja Canto Musical de 28/08/1966)
Durante esse ano Nabor viveu com o povo do sertão e começou a sentir suas angústias e seus problemas. Começou a se interessar por suas músicas. Posso imaginar como ele se sentiu. Ainda guardo as recordações de minha visita a Corrente em 1961 e a “serenata” que tive o privilégio de ouvir uma noite, após os trabalhos, e à luz de lampião. Não é difícil se contagiar pelas músicas do sertão, especialmente quando são ouvidas “inloco”.
Nabor sentiu necessidade de interpretar os sentimentos daquele povo através da música sacra, mas sabia que para isso teria que voltar ao Seminário e completar o curso de Música Sacra. Assim voltou a Recife em 1971, e em 1972 recebeu o grau de Bacharel em Música Sacra. Durante esse período de estudos serviu à Igreja Evangélica Batista de Casa Amarela como Diretor de Música e Auxiliar do Pastor Merval Rosa. No Natal, de 1972, ele dirigiu um coral e orquestra na apresentação da 1ª parte do “Messias”.
Ao formar-se pela segunda vez no Seminário, aceitou o convite para voltar ao Seminário em Recife, pela terceira vez, agora para fazer parte de seu Corpo Docente, lecionando as matérias de Contraponto, Composição e Órgão. Durante essa época havia intercâmbio entre o Seminário e a Universidade Federal de Pernambuco, e assim Nabor ensinou, por algum tempo, Canto Coral e Harmonia nesta última instituição.
Foi como figura destacada no Corpo Docente do Seminário do Norte que a Denominação Batista em geral conheceu o Prof. Nabor Nunes.
Em 1973, numa conferência de âmbito nacional realizada no Seminário do Sul, Nabor proferiu uma palestra sobre a música sacra brasileira. Em 1974 ele viajou para os EEUU com o “Folcoral Batista” onde teve oportunidade de ouvir algumas composições suas cantadas no exterior.
Durante a última assembleia da CCB, foram ouvidas várias obras do Prof. Gamaliel Perruci, Prof. Nabor Nunes e Padre José Maurício, este o primeiro grande compositor brasileiro de música sacra. De Nabor ouvimos “Sonda Me, Ó Deus”, “Creio em Deus”, “O Pai Nosso Sertanejo”, “Salmo 100” e “Salmo 23”.
Outras composições de Nabor Nunes incluem “Glória a Deus nas Alturas”, uma “Bênção Araônica”, um “Amém Coral”, “Sertanejo No. 1 (para orquestra de cordas) e três solos para soprano – “Salmo 117”, “As Bem Aventuranças” e “O Magnificat Sertanejo”, todos estes últimos em estilo sertanejo.
Talvez a composição mais conhecida do Prof. Nabor seja “O Pai Nosso Sertanejo”, escrita originalmente para solo com acompanhamento de violão, mas que mais tarde foi escrita para coro e cantada assim pela primeira vez numa Clínica de Música realizada em Maceió em 1972.
A Divisão de Música da JUERP publicou no Vol. II de O NOVO SOM DA VIDA, essa composição, e mais “O Salmo 23” de Nabor. O “Amém Coral” escrito por ele, bem como uma harmonização do Prof. Gamaliel Perruci foram publicados no Vol. I de CORAL SINFÔNICO, publicado também pela JUERP há muitos anos atrás.
Achamos excelentes e significativas estas iniciativas de Nabor Nunes e de Gamaliel Perruci no campo da composição. Que a nossa Denominação possa criar as condições necessárias para que eles e outros que hão de vir possam desenvolver e aperfeiçoar cada vez mais os seus talentos musicais para servir, honrar e glorificar o Supremo Criador. É nossa sincera oração.
Nabor Nunes possuiu graduação em Música pela Universidade Estadual de Campinas (1989), mestrado em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (1994) e doutorado em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (1997). Até 2007 atuou como professor da Universidade Metodista de Piracicaba. Ainda na Universidade Metodista de Piracicaba, atuou como Compositor Musical e Regente de Coro no Núcleo Universitário de Cultura. Teve experiência nas áreas de Teologia e de Artes, com ênfase em Música, atuando principalmente em Composição, Regência e História da Música.
Nabor Nunes Filho faleceu em 13 de Fevereiro de 2013 no Estado de São Paulo.
“Publicado originalmente em: “O Jornal Batista”, Ed. 12, Março de 1978, pág. 2″ “Coluna Canto Musical – Título original do artigo: Onde estão os Compositores Batistas Brasileiros?”
© 1978 de Bill H. Ichter /Atualização: (2015): Robson José – Usado com permissão
Fotografia extraída de: “O Jornal Batista” (http://www.batistas.com/o-jornal-batista).
O que tem sido feito é pouco
(Entrevista com o Pastor Nabor Nunes Filho)
Nas edições de 26 de abril, 03, 10 e 24 de maio, entrevistamos os professores Henriqueta Rosa Fernandes Braga, do Rio de Janeiro e Gamaliel Perruci, do Recife.
Nesta, o pastor Nabor Nunes Filho, de São Paulo, que estudou no Seminário Teológico Batista do Norte do brasil, onde bacharelou-se em Teologia e em Música Sacra. Exerceu pastorado na Igreja Batista de Corrente, PI, e, interinamente, na Igreja Batista da Concórdia, em Recife, PE. Foi professor do Seminário Teológico e do Seminário de Educadoras Cristãs, em Recife. Exerceu o Ministério de Música nas igrejas batistas de Casa Amarela, da Concórdia e da Capunga, todas na capital pernambucana. Foi ministro de Música da Primeira Igreja Batista em São Paulo e professor da Faculdade Teológica Batista na capital paulistana.
Depois de longa meditação, deu as seguintes respostas ao nosso questionário:
Rolando de Nassau – As Primeiras Igrejas de São Paulo e de Bauru, e algumas outras igrejas batistas, possuem seus Ministros de Música. Mas até mesmo as maiores igrejas das grandes cidades não tem departamentos de música. Sabendo-se que os seminários denominacionais estão formando anualmente dezenas de bacharéis em Música Sacra, é evidente que a maioria deles não está sendo aproveitada pelas igrejas. A que atribui essa deficiência de procura, num mercado-de-trabalho repleto de pessoas capacitadas para o Ministério de Música?
Nabor Nunes Filho – Creio tratar-se de um problema de visão. Há uma quase que completa desinformação a respeito do verdadeiro lugar que deve ocupar a música na vida da igreja. A Música Sacra tem sido utilizada nas igrejas de maneira formal e superficial. Temos usado a música para atrair as pessoas, para a promoção de movimentos e dias especiais, etc. Não raro, vêmo-la utilizada para acalmar os ânimos ou descansar um plenário exausto em sessões de igrejas e assembleias convencionais. Nada há de reprovável nisso, evidentemente. Esse, porém, é apenas um aspecto externista do uso da música sacra. Vista desta maneira, a música em nossas igrejas assemelha-se a um acessório especial, semelhante aos serviços de bordo em companhias aéreas, que servem para atrair passageiros, fazem-nos viajar confortavelmente, porém não fazem o avião levantar voo.
Para o exercício dessa visão é bastante que a igreja possua em seu rol de membros pessoas talentosas e preparadas, que se disponham a dar do tempo que lhes sobra para ensaiar o Coral, tocar ou reger. A maioria das igrejas, ao que me parece, está acomodada a essa maneira de encarar a música. Afinal, “nosso povo é muito animado para cantar, o nosso Coral é regido por excelente maestro e os nossos instrumentistas são formados em conservatórios; para que queremos um Ministro de Música?” Frase como esta eu já tenho ouvido.
Creio que já é tempo de alargarmos a nossa visão, aprofundando os conceitos, lembrando que, tanto quanto o ensino e a pregação, a música é fator indispensável ao crescimento e edificação da igreja. O cultivo do hábito de louvar a Deus com salmos, hinos e cânticos espirituais faz parte da metodologia bíblica, para o aconselhamento e admoestação mútuos dos filhos de Deus (Col. 3:16) e para que a igreja se Encha do Espírito Santo (Ef. 5:18-19)
É preciso que se desenvolva uma Teologia do Louvor para impedir que a Música Sacra seja desviada deste propósito fundamental. Aliás, o culto é uma área muito negligenciada pela nossa teologia.
Procurar levar o Povo de Deus a uma autêntica experiência de louvor, como fator indispensável ao seu crescimento em todos os sentidos, é a responsabilidade do Ministério de Música. Para desenvolver esta visão não é suficiente ser um bom regente, ou instrumentista; é necessário, além disso, ser vocacionado. É isto que a maioria das igrejas e dos líderes ainda não compreendeu. Ao meu ver, está aí o núcleo do problema
Por uma reforma curricular
Rolando de Nassau – Muitos jovens formados em Música Sacra estão sendo desviados de suas verdadeiras funções nas igrejas. Acha que eles estão encarando o Ministério da Música como vocação e/ou profissão?
Nabor Nunes Filho – Creio que, em sua grande maioria, os jovens que se matriculam em um seminário são verdadeiramente vocacionados. O que ocorre é que a natureza e o alcance desta vocação não estão bem definidos em suas mentes. Para eles, sua atuação e interesse resumem-se unicamente no aprofundamento e aplicação de conhecimentos musicais. Eu sou dos que defendem que a habilitação para o Ministério da Música deve incluir uma sólida formação teológica; a formação técnica, embora importantíssima, é complementar. O fundamental é o desenvolvimento de uma visão integrada do Ministério como um todo, não tendo em conta apenas uma área isolada de atuação. Chego até mesmo a sugerir que haja, no futuro, uma reforma nos currículos dos nossos seminários e faculdades. A estrutura curricular atual das nossas escolas com a existência de três cursos distintos, tais como: Teologia, Educação Religiosa e Música Sacra, tem contribuído para que se tenha em mente a existência de três ministérios diferentes, em sua natureza e finalidade, e sem nenhuma vinculação fundamental um com o outro. Se, em vez de três cursos, houvesse apenas um: o de Ministério Cristão, com as devidas habilitações em três ou mais áreas, isso já contribuiria para se entender que o Magistério Teológico, Educação Religiosa, Música Sacra, Serviço Social, Pregação, etc., são facetas diferentes de uma mesma vocação e de um só Ministério, servindo, dentro da metodologia divina, a um só propósito: a edificação do Corpo de Cristo. Mesmo assim, algumas de nossas instituições se empenham para corrigir essa distorção, incluindo nos programas do Curso de Música Sacra, por exemplo, disciplinas na área de Teologia ou Educação Religiosa. Ocorre que grande parte dos estudantes tem murmurado contra essas inclusões, conforme eu mesmo tenho verificado como professor, antes no Seminário do Norte, agora na Faculdade Teológica de São Paulo. Muitos até consideram essas disciplinas como preenchimento de tempo ocioso.
Por outro lado, a visão das próprias igrejas está condicionada a dar maior destaque e valorização quase absoluta ao chamado Ministério da Palavra, colocando os demais em um grau de importância inferior, a nível de necessidades apenas eventuais. Há o perigo de uma hierarquização no Ministério, através de um desnível, em termos até de “status”. É preciso que seja entendido que o chamado Ministro de Música não é necessariamente desqualificado para a Pregação, o Aconselhamento, a Ministração das Ordenanças, etc. É bom lembrar que os músicos de Israel eram investidos de prerrogativas sacerdotais (I Crônicas, cap. 15 e 16).
Necessário se faz que as igrejas se estruturem de modo a não desviarem os jovens, Ministros de Deus voltados para o Culto e o Louvor, da sua verdadeira função e posição. É necessário, por outro , lado, que os assim chamados Ministros de Música desenvolvam plena consciência do alcance da sua vocação, como sendo igualmente “despenseiros dos ministérios de Deus”, e assim se posicionem.
Pelo aperfeiçoamento dos leigos
Rolando de Nassau – Os seminários formam bacharéis que se destinam ao Ministério da Música. Estariam beneficiando o mercado-de-trabalho, se promovessem cursos abreviados para leigos que desejam servir melhor às suas igrejas como regentes e acompanhistas?
Nabor Nunes Filho – Sem dúvida nenhuma! Durante três dos cinco anos em que fui professor do Seminário do Norte, aquela instituição promoveu cursos intensivos, chamados Cursos Práticos de Verão. Visavam aqueles cursos oferecer às igrejas um treinamento básico aos seus membros mais talentosos, principalmente nas áreas de Regência e Acompanhamento. Pude observar que alguns jovens, que estavam se saindo muito bem em seus cursos seculares de piano, apresentavam certa dificuldade na técnica do acompanhamento congregacional e o coral. Daí a necessidade desses cursos, não apenas para ensinar as primeiras noções de Teoria Musical, visando um futuro ingresso no bacharelado, como também dotar, aos que já têm formação musical secular, da compreensão de como exercerem os seus talentos na igreja. Ademais, a formação de uma boa equipe dos chamados leigos é de grande ajuda para o Ministro de Música. Ninguém pode trabalhar sozinho.
Nossa participação é significante
Rolando de Nassau – No Primeiro Encontro Nacional de Músicos Batistas, em janeiro de 1977, em Curitiba, PR, foi prometido que seriam incentivados os compositores brasileiros. EM janeiro de 1979, na assembleia convencional na Igreja de Vila Mariana, o “manifesto dos músicos” (ver: “O Jornal Batista”, 17 jun 79,p. 2), solicitava o aproveitamento imediato das possibilidades dos nossos poetas e compositores. No Segundo Encontro, em julho desse ano, no Rio de Janeiro, RJ, foi aprovada uma recomendação, no sentido de que fosse aumentada a porcentagem da publicação de músicas compostas por brasileiros. Que foi feito de prático com as intenções proclamadas em Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro?
Nabor Nunes Filho – Para responder esta pergunta, quero invocar alguns dados, que eu mesmo colhi, de uma recente lista de preços distribuída pela JUERP. Reconheço não representar, a referida lista, um catálogo completo das publicações daquela Junta.
Entretanto, ela é um demonstrativo do que há hoje à disposição das igrejas, nas lojas da Casa Publicadora Batista. Vamos aos dados.
Das 226 publicações da JUERP (sem contar com as edições da Bíblia e do “Cantor Cristão”), apenas 40, representando 17,6% do total, dizem respeito à música; destas 40, apenas 29 são coletâneas com partituras, ou partituras avulsas, representando apenas 12,8% do total das publicações. Destas 29 coletâneas, apenas 2 ostentam nomes de brasileiros, quais sejam: Composições Sacras, de Júlio de Oliveira, e Prelúdios para piano, compilação de Edile C. D. Cavalcanti. A porcentagem já diminuiu bastante: 7% em relação a todas as publicações musicais. Quanto à inclusão de músicas de compositores brasileiros, a maior proporção encontra-se no hinário Vinde Cantai, com 16 músicas, dentre um total de 67, representando 23,8%.
Repito-lhe: valho-me, não de uma pesquisa exaustiva, porém de dados de uma lista de preços. Oxalá eu esteja enganado. Porém se os dados estiverem ao menos próximos da exatidão, pode-se tirar duas conclusões: a primeira é que há um grande desequilíbrio entre o que se publica em geral e as publicações musicais. Aliás, a porcentagem de 17,8% é um sintoma do que foi dito acima, isto é, que a música não ocupa lugar importante no centro dos interesses da nossa liderança. O seu lugar é na periferia. Esse desequilíbrio precisa ser corrigido. É preciso dar, ao Povo de Deus, o que ler e o que cantar, na mesma proporção.
A segunda conclusão que tiramos é que a participação do compositor brasileiro nas nossas publicações é ainda insignificante. A despeito do grande passo dado com o Vinde Cantai, o desequilíbrio entre os números de músicas de autores estrangeiros e brasileiros é muito grande, em favor dos primeiros. Os manifestos e recomendações apresentados até votados, não propugnaram pela extirpação das obras traduzidas, evidenciando um nacionalismo exacerbado, conforme algumas pessoas mas as pessoas pensam. O que se propõe é o estabelecimento de um equilíbrio de participação. Pessoalmente não sou contra traduções, desde que bem feitas. O que eu não posso entender nem aceitar é que, enquanto há um esforço para se fazer traduções de obras de procedência longínqua, a cantata As Bem-Aventuranças, de Gamaliel Perruci, encontra-se engavetada há quase dois anos (só para citar um exemplo). A Denominação precisa conhecer compositores como (além do já citado) Marcílio de Oliveira Filho, Almir Rosa, Simei Monteiro, João Fernandes, Cleide Benjamin, e outros. Mas não são apenas seus nomes que devem ser conhecidos, pois já o são sobejamente; é o trabalho sério, de peso e de grande inspiração que eles produzem, que deve ser apreciado, para o louvor de Deus. É bom lembrar que as obras destes compositores estão interessando outras editoras, até mesmo seculares.
Não posso aquilatar o que esteja por trás das intenções.
Espero que estas sejam as melhores. Ocorre, entretanto, que o que tem sido feito, para atender a uma legítima aspiração do povo batista brasileiro, é, substancialmente falando, irrisório e superficial. Estamos desperdiçando um patrimônio e, assim, correndo o sério risco de descumprir um dos aspectos da mordomia dos talentos.
Há muitos discos e poucas partituras
Rolando de Nassau – Qual sua impressão sobre o movimento editorial e discográfico musical no meio evangélico brasileiro?
Nabor Nunes Filho – Verifico duas tendências bastante sutis, por isso mesmo perigosas, na discografia evangélica, em confronto com o movimento editorial. A primeira, é o crescimento acelerado na produção de discos e o crescimento por demais moroso na publicação de partituras. Este fenômeno é facilmente verificável ao comparar-se as prateleiras de discos com as de partituras, em qualquer livraria evangélica. Podemos observar, então, um cada vez mais crescente estímulo ao ouvir e um não proporcional estímulo ao cantar. Corremos o risco de inverter os valores do louvor a Deus. Não é ouvindo, porém cantando que louvamos. É, portanto, o cantar que deve ser estimulado. Creio que o recurso tecnológico da gravação deve ser usado como método para ensinar o povo a cantar mais, porque aí é que reside o verdadeiro louvor. Porém, isso tem que ser respaldado por uma correspondente distribuição das partituras das músicas gravadas. Por outro lado, em Música Sacra, o que é apenas ouvido, perece; o que é executado, sobrevive; e o que é executado, porque escrito, permanece.
O perigo do consumismo
A segunda tendência é mais sutil que a primeira. É a do consumismo. Há uma grande oferta em discos para um público evangélico consumidor. Ora, a oferta sempre estimula a procura, e esta tende à massificação. E é aí que reside um grande perigo: o da visível negligência na qualidade das gravações. Imbuídos da intenção de dar ao povo “a música-que-o-povo-gosta”, os produtores de discos estão, com raras exceções, descuidando-se do aspecto qualitativo. Não é “a-música-que-o-povo-gosta” que deve ser produzida, porém aquela que é capaz de elevar o nível do povo a um louvor cada vez mais escolhido. Cantar ao Senhor um CÂNTICO NOVO significa cantar cada vez melhor, música sempre melhores. Não é a simples novidade, mas a novidade com qualidade que deve ser oferecida ao povo de Deus.
Rolando de Nassau – Que acha da inserção de um suplemento no atual “Cantor Cristão”, para a introdução de novos hinos, nacionais e estrangeiros?
Nabor Nunes Filho – Quanto à introdução de novos hinos de autores nacionais e estrangeiros, isso é ponto pacífico. Creio, no entanto, que um suplemento não seria o melhor método. A minha proposta é de uma avaliação periódica do nosso hinário oficial, com vistas à inclusão de novos hinos. Creio ser este o único antídoto contra a proliferação de corinhos de procedência desconhecida, contendo doutrinas, algumas estranhas, que estão sutilmente invadindo os nossos arraiais”.
(Entrevista publicada originalmente em “O Jornal Batista”, 09 de Agosto de 1981 p. 2 / 16 de Agosto de 1981, p. 2)
Música. Nº 217 e 218
© 1981 de Rolando de Nassau – Usado com permissão
O Maestro Nabor Nunes partiu para cantar no Coro Celeste
No último domingo, 17 de fevereiro de 2013, participei de dois momentos em cultos em Ação de Graças a Deus pela vida e pela influência de Nabor Nunes Filho, o primeiro no culto matinal na IB do Cordeiro, no Recife, onde Nabor foi ministro da juventude, organista e pastor interino (1965-1969), no qual lemos o seu resumo biográfico, recordamos da figura querida de Nabor o centenário do Coro IBCor, sob a regência do maestro Daniel Gouveia, entoou o “Pai Nosso Sertanejo” e a Igreja agradeceu a Deus pela vida de Nabor e por sua influência e rogamos as consolações do Altíssimo para Miriam e para os filhos e netos.
O segundo momento, no culto noturno da IB da Capunga, quando o pastor Ney Ladeia, recordou a passagem de Nabor no ministério da Igreja, leu o resumo biográfico, recordou da apresentação pelo Coro Capunga, da cantata de sua autoria, e da amizade que a une a ele e a muitos membros da IB Capunga, o Coro Capunga, sob a regência do maestro Apolonio Ataíde entoou “Creio em Deus” e agradecemos a Deus pela vida de Nabor e rogamos bênçãos para a família que ficou aguardando o reencontro celeste.
Um terceiro momento, em que não pudemos estar presentes, pela distância, quando a IB Liberdade (SP), pastorada por nosso amigo Eli Fernandes, rendeu graças a Deus pela vida de Nabor, com o Coro Liberdade, dirigida pelo maestro Donaldo Guedes, amigo pessoal e discípulo de Nabor, enlevando a congregação da Liberdade. No momento em que a saudade nos faz sentir a falta de Nabor, agradecemos a Deus porque sua vida, sua influência nos fez mais cristãos e sua música, divinamente inspirada nos aproxima de Deus.
O maestro Nabor Nunes Filho, o pioneiro da música sacra em ritmo nordestino, membro da Igreja Batista da Liberdade (SP), ovelha do pastor Eli Fernandes de Oliveira, faleceu a 12 de fevereiro de 2013, de infarto fulminante, na sua residência em Americana (SP). Nabor era casado com a médica Miriam Correia Ferreira Nunes, e tinha três filhos Adriana, Luciana e Luciano.
Nabor Nunes filho nasceu em Itabaiana (PB), a 27 de junho de 1944, filho de Noemi Marques de Figueira e de Nabor Nunes Figueira, sendo ela membro da Igreja Batista de Itabaiana, igreja onde a mãe ensinou o filho a adorar a Deus.
Nabor Nunes cursou o fundamental e o médio (antigos ginasial e científico) no Colégio Americano Batista, no Recife (PE), passando a cultura a Deus na IB do Cordeiro (Pr. David Mein). Ouvia a palestra do Pr. David Gomes, sobre missões, “Nabor, sentado ao piano, sentiu que Deus estava tocando em sua vida. Sentiu-se despertado para o ministério” (ICHTER, Bill H. Onde estão os Compositores Batistas Brasileiros? OJB, de 16.08.1985, p. 2), quando sentiu a chamada para o ministério. Recomendado ao Seminário Batista (STBNB), cursou o Bacharelado em Teologia (e as disciplinas de Música Sacra que o tempo permitia), servindo na IB Cordeiro (IBCor), entre 1965 e 1969, como auxiliar do Pr. David Mein.Recebeu o grau de Bacharel em Teologia no STBNB, no Recife (1969), com crédito da muitas disciplinas, em especial regência e órgão do Curso de Mùsica Sacra. Consagrado ao ministério serviu como pastor interino da IBCor, na ausência do Pr. David Mein (1969).
Empossado no pastorado da IB Corrente (1970-1972) ali “viveu com o povo do sertão e começou a se interessar por suas angústias e seus problemas”. Ouvindo suas músicas “sentiu necessidade de interpretar os sentimentos daquele povo através da música sacra” (ICHTER, Bill H.). Compôs músicas no ritmo de cancioneiro nordestino, entre as quais, “Pai Nosso Sertanejo” (HCC 384), Creio em Deus, Salmo 146 “Aleluia!”, e a cantata de Natal “O Esperado”. Era membro da Igreja Batista da Liberdade (SP), ovelha do pastor Eli Fernandes de Oliveira.
Casou com Mirian Correa Ferreira (1969), neta do pastor Sebastião Tiago Correa de Araújo (IBCor), médica, com quem teve os filhos Adriana, Luciana e Luciano. Retornou ao Seminário Batista, onde concluiu o Bacharelado em Música Sacra e serviu como professor (1973-1978), e como ministro de música na IB Concórdia e na IB da Capunga, no Recife. Mudou para São Paulo, indo pastorear uma Igreja Batista. Ingressou na Universidade Metodista de Piracicaba-UNMESP (1980), onde cursou a Graduação em Música, Mestrado em Educação (1991-1994), com a dissertação “Eros e Humanização”, sendo orientado pelo Dr. Hugo Assmann, e o Doutorado em Educação, com a tese “Devaneio e arte na complexidade humana”, na mesma Universidade. Assumiu a regência de disciplinas na UNMESP (1984) e o cargo de maestro regente do Coral Universitário da Universidade Metodista de Piracicaba (1984), fazendo composições. Assumiu a função de Diretor e Administrador do Núcleo Universitário de Cultura (1986) da UNIMESP, em Santa Bárbara D’Oeste (SP).
Nabor Nunes Filho foi pastor e ministro de música em várias igrejas batistas no Brasil. Escritor, ensaísta, pesquisador, poeta cordelista, memorialista, pensador, produtor cultural, educador, orador e conferencista, músico, pianista e compositor. Membro do Conselho da Faculdade de Ciências da Religião, e vinculado a Comissões e Consultoria da Universidade Metodista de Piracicaba. Nabor Nunes é citado no Dicionário de Música Evangélica (1994), de Rolando de Nassau. É verbete do Dicionário Bibliográfico Regional do Brasil, de Mário Ribeiro Martins.
Nabor Nunes Filho descendia de família de poetas de cordel e de repentistas nordestinos, que inclui Paulo Nunes Batista, Agostinho Nunes, Ugolino Nunes e Nicandro Nunes.
Ao Senhor sejam dadas honra e glória e louvor, para sempre, pela obra e pela vida do seu Servo Nabor Nunes Filho, que agora n’Ele descansa. Amém!
(Publicado originalmente em “O Jornal Batista”, 10 de Março de 2013, p.13, Ed. 10)
© 2013 de Francisco Bonato Pereira – Usado com permissão
Nabor Nunes Filho, o intelectual alegre
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte” (Euclides da Cunha)
“Os intelectuais não têm a obrigação de transformar o mundo;
o seu dever é transfigurá-lo” (Otto Maria Carpeaux)
(Dedicado à leitora Hadassa Mestrinho Sylvestre. de Belém, PA)
Nabor Nunes Filho (1944-2013) foi um dos mais notáveis intelectuais no ambiente cultural evangélico (Rolando de Nassau, Dicionário de Música Evangélica, p. 128. Brasília: edição do autor, 1994), um intelectual que uniu pensamento e ação. Começou a produzir em 1965; parou em 2013.
Por meio de um portal de notícias da internet, soubemos algo a respeito do seu repentino falecimento, em 12 de fevereiro, em Americana (SP).
As atividades intelectuais de Nabor foram desenvolvidas nas seguintes áreas:
TEOLOGIA
Fez o curso de bacharel no STBNB (1965-1969); consagrado ao ministério pastoral, serviu à IB do Cordeiro, no Recife, PE, como interino na ausência de David Mein (1969). Pastoreou a IB de Corrente, PI (1970-1972). Nabor não reteve a paisagem sofredora do Nordeste; ele a transfigurou numa visão otimista. Exerceu opastorado da PIB de Americana, SP (1981-1984). Dedicou-se mais às outras áreas.
MÚSICA
Em 1953, com apenas nove anos de idade, tornou-se organista da IB de Itabaiana, PB, sua cidade natal. Aos 13 anos, tocava requinta na banda de música.
Fez o curso de bacharel no STBNB (1971-1972); complementou-o (graduação em Composição) na Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP (1983-1989). Depois desse curso, fez revisões em várias de suas peças musicais. Foi ministro de música nas igrejas de Casa Amarela, da Concórdia e da Capunga, no Recife, PE (1976-1978), e da PIB de São Paulo, SP (1979-l981).
Foi compositor na Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP (1986-2005). Publicou partituras: a) para coro – coletânea”Creio em Deus” (1995), “Ele está vivo” (1997), “Glória a Deus nas alturas” (2002), “O Verbo se fez carne (2009) e “Cadernos”, I e II (2012 e 2013); b) para órgão – “Interlúdio” (1987), “Fuga litúrgica”, “Pequena imitação”, “Fantasia Nordeste” e “Valsinha” (1991), e “Prelúdio e Fuga” (2002); c) para piano – “Vespertinas” (1988/1999); d) para orquestra de cordas – “Trio” (1988), “Prelúdio” e “Fugueta” (2009); e) para dez arranjos de composições de música popular brasileira.
Foi pioneiro da hinodia evangélica em estilo sertanejo do Nordeste.
Escreveu as letras dos hinos “Nosso Pai que estás nos céus”, 1972, (HCC-384) e para a coletânea “Celebrai cantando”, 1982 (pp. 8, 42, 58, 89 e 93); compôs a música do hino “Só Jesus Cristo salva”, 1980 (HCC-542). Além do hinário batista, o presbiteriano independente (“Cantai todos os povos”, 2006, nºs. 261 e 307) acolheu hinos de Nabor.
Regeu os coros: 1) da PIB de Fortaleza,CE, 1972; 2) da IB da Concórdia, em Recife, PE, 1974-1976; 3) da FTB de São Paulo,SP, 1979; 4) da FTB de Campinas, SP, 1983; 5) da UNIMEP, em Piracicaba, SP, de 1995 a 2007.
Em 1981, Nabor concedeu-nos entrevista, numa época em que a indústria fonográfica começou a se interessar pelos Evangélicos. À nossa pergunta, Nabor respondeu-nos assim: “Há uma grande oferta em discos para um público evangélico consumidor. Ora, a oferta sempre estimula a procura, e esta tende à massificação. Os produtores de discos estão, com raras exceções, descuidando-se do aspecto qualitativo” (OJB, 16 ago 81).
PEDAGOGIA
Tendo feito mestrado em Educação (1992 a 1994), defendeu a dissertação “Eros e Humanização” (1994), e doutorado (1995-1997), com a tese “Devaneio e Arte na complexidade humana” (1997); participou em bancas examinadoras de dissertações e teses, para obtenção de mestrado e doutorado em Educação (1998/2001), e orientou trabalhos de conclusão de cursos de graduação em Educação (2005).
MAGISTÉRIO
Foi professor de Teologia e de Música no STBNB (1974-1978); na UNIMEP, de Música (1984-2007) e de Teologia (1984-2013); nessas escolas, suas especialidades foram composição, instrumentação e regência.
Em 1992 e 1993, professor de Introdução à Filosofia, no Colégio Piracicabano. A universidade e o colégio são prestigiosas instituições metodistas.
ADMINISTRAÇÃO EDUCACIONAL
De 1984 a 2013, foi membro do Conselho da Faculdade de Ciências da Religião (UNIMEP); de 1986 a 2013, administrador do Núcleo Universitário de Cultura, em Santa Bárbara do Oeste (SP).
LITERATURA
Descendente de uma família de literatos, no periodismo Nabor colaborou com a revista “Diálogo”(editora católica “Paulinas”), nos artigos sobre a linguagem da música sacra, e a religião como expressão do corpo (1999, 2000 e 2003), e com a revista “Impulso” (editora metodista), no artigo “Religião e Tecnologia” (2003). Seu artigo “Arte: a religião de corpo inteiro”, foi citado por Adelar Hengemühle numa obra de pesquisa pedagógica (2008).
No ensaísmo, escreveu “Porque não sei ficar quieto” (1996) e “Eroticamente humano”(1997), este comentado por Flávia Daniela Delgado, na revista “Educação” (2011), a propósito de erotismo na televisão. Nesse mesmo ano, Dulcilene Brito Lopes, num artigo sobre a poesia erótica de Cecília Meireles, baseou-se em teorias de Georges Bataille, Roland Barthes, Octávio Paz, Affonso Romano de Sant’Anna e Nabor Nunes Filho.
Escreveu dois romances: “Cláudia e Anelise: paixões de outono” (2010) e “Natália: atrevimentos e destinos” (2012).
Publicou dois livros de poemas: “Versos do amor diverso” (2010) e “Fra (n) quezas de (não) ser” (2012). Em 1992, Nabor escreveu o poema “Meu outro”, do qual extraímos estes versos:”Doravante, quero viver esse meu outro …
Ele me faz querer ser o que é, e o que não é, ser mais ainda. Instiga-me a fazer que minha solidão me baste e que meu vazio me preencha por inteiro”.
Certa vez, Nabor assim definiu sua personalidade: “Um exilado de todas as nações, um estranho em todos os lugares, o avesso de todos os tecidos, o fugitivo de todas as prisões” (http://www.oliberalnet.com.br/ acesso em 15 fev 2013). Mas o escritor Mário Ribeiro Martins, colega de Nabor no STBNB (1965-1969), lembra que “ele era falastrão e alegre”.
(Publicado em “O Jornal Batista”, 16 de junho de 2013, p. 3).
Música – 786
© 2013 de Rolando de Nassau – Usado com permissão
Saudades do grande Porf.Nabor! Pessoa e profissional fascinante! Suas aulas na Unimed eram geniais e inspiradoras…
Alguém tem a partitura do Natal Brasileiro do Nabor?