Liturgistas e Musicólogos que escreveram sobre Hinologia – Rolando de Nassau
Liturgistas e Musicólogos que escreveram sobre Hinologia
Especial para “Hinologia Cristã”
No artigo no. 132 (01 out 2022) afirmei que as quatro áreas (HINOLOGIA, HINODIA, HINOGRAFIA e HISTÓRIA DE HINOS) não têm sido definidas corretamente.
Meu propósito, mais uma vez, é esclarecer esta questão.
Os liturgistas e musicólogos apresentados neste ensaio não eram hinólogos.
Desde suas origens, o Cristianismo tem considerado o canto como parte integrante da liturgia; ele não deve servir de pretexto, nem de acompanhamento da oração.
Na última Páscoa e na primeira Ceia o canto teve sua parte. (ver: Chirat, Henri. L’ assemblée chrétienne à l’ âge apostolique. Paris: Le Cerf, 1949). No ano 29 da Era Cristã, Jesus reuniu Seus 12 discípulos no Cenáculo, em Jerusalém; ao final da refeição, cantaram cinco salmos.
João Marcos, 40 anos depois, escreveu em seu Evangelho que tinham cantado “um hino”; assim, Marcos revelou-se o primeiro hinólogo da história cristã (ver: Hollanda, Roberto Torres. Os ensinos de Jesus. Brasília: edição do Autor, 2022).
Nos primórdios da igreja primitiva, a HINOGRAFIA tinha origem eclesiástica. No culto dominical, a congregação cantava; ao princípio, hinos cristãos. Eusébio de Cesaréia (263-340 d.C.) mostrou ser conhecedor da HINODIA do seu tempo. Por isso, ficou conhecido por sua enciclopédia bíblica. Na “História Eclesiástica”, Livro V, Capítulo 28, indagou: “Quem desconhece os numerosos cânticos e hinos compostos pelos Irmãos fiéis dos primeiros tempos?”.
Havia quatro tipos de Salmodia: 1) solo integral; 2) salmodia alternada; 3) canto responsorial; 4) canto alternado (ver: Nassau, Rolando de. Introdução à Música Sacra. Rio de Janeiro: edição do Autor, 1957).
O apóstolo Paulo afirmava que as mulheres deviam guardar silêncio; Ambrósio de Milão e João Crisóstomo proclamavam a igualdade dos sexos (ver: De Valois, Jean. Le Chant Grégorien).
A partir do século 4º., sob o imperador romano Constantino, desenvolveu-se a HINOGRAFIA, mas a congregação não podia participar das orações e dos cantos porque não compreendia o idioma grego. Por isso, a igreja começou a usar o latim. Prestigiada, tinha uma liturgia bem organizada, onde o canto ocupava um lugar importante. Também a igreja ocidental adotou dois ritos litúrgicos (ver: Wellesz, Egon. A History of Bizantine Music and Hymnography. Oxford: Clarendon, 1949).
Em dois ritos orientais (o bizantino e o sírio) predominou a HINOGRAFIA sobre a salmodia (ver: Bolisani, E. L’ innologia cristiana antica. Padua, 1963).
O rito bizantino, elaborado por João Crisóstomo (344-407), bispo de Constantinopla, e praticado pelos Cristãos Ortodoxos, em língua grega, era dotado de uma abundante
HINOGRAFIA
Efraim da Síria (306-373) criou uma HINODIA conforme à doutrina ortodoxa, em contraposição à agnóstica de Bardesanes da Síria (154-222). Atualmente, o rito bizantino equivale a rito oriental, e o rito romano a rito ocidental. Na Palestina e na Síria, a HINOGRAFIA desenvolveu-se a partir do século 4º.
No Ocidente os hinos de Ambrósio de Milão (340-397) serviram de modelo; ele teve a iniciativa de introduzir hinos na Igreja Romana, que foi a última a aceitá-los, embora já cantados nas igrejas monásticas; só entraram no século 12; eram cerca de 30 mil hinos (ver: Paris, P. Les hymnes de la liturgie romaine. Beauchesne: 1954).
No final do século 4º., Agostinho de Hipona (354-430) queixou-se de que certos bispos se serviam de orações compostas por autores incompetentes e até heréticos.
Sobre a HINODIA produzida entre os anos 400 e 900 foram publicadas as importantes obras de J.A.Jungmann (Des lois de la célébration liturgique. Paris: Du Cerf, 1956; Missarum Solemnia).
No século 5º., as profissões de fé tornaram-se cânticos litúrgicos (ver: Righetti, M. Manuale di storia liturgica. Milano: Ancora, 1964).
Entre os hinógrafos medievais que obtiveram proeminência, cito João de Damasco (675-749); ver: Chailley, J. Histoire musicale du Moyen Âge. Paris: PUF, 1950).
O sociólogo Olivier Cullin afirmou que a Igreja Católica “não deixou de cantar, em todos os tons, num duplo movimento para unificação do seu repertório e diversificação de sua expressão” (ver: Brève Histoire de la musique au Moyen Âge. Paris: Fayard, 2002).
O ofício litúrgico dos Cristãos Católicos, no século 11º., foi caracterizado pelo predomínio da HINOGRAFIA, que expulsou quase completamente a salmodia; usava a língua latina ou a siríaca.
Os cânticos medievais, não-bíblicos, foram reprimidos, até o século 9º., pelos Católicos (ver: Schirò, G. Innografia. Vaticano: 1951); depois, foram acolhidos pela Igreja Católica Romana.
Do 10º. ao 16º. século, quando floresceu a polifonia, nas obras de Machaut e Josquin, devo citar Van Den Borren (ver: Études sur le XV siècle musical) e Yvonne Rokseth (ver: Polyphonies du XIII siècle).
Os Cristãos Protestantes e Evangélicos, desde o 16º. século, liderados por Martin Luther, Jean Calvin e Charles Wesley, têm dado entusiástica contribuição à HINODIA e à HINOGRAFIA, por meio do “Hymns Ancient and Modern”, e dos hinários sucessores. No Brasil protestante e evangélico pouca atenção é conferida à HINOLOGIA.
William Henry Monk, John Julian e Erick Routley interessaram-se pela HINOLOGIA.
Creio que Edmund H. Fellowes (1870-1951) foi o mais importante hinólogo protestante (ver: English Cathedral Music. London: Methuen, 1941).
Esta obra, que trata de dois tipos de música, o “service” (música litúrgica) e o “anthem” (peça de canto congregacional), usados nas catedrais e nas paróquias da Comunidade Anglicana, foi elaborada durante a fase inicial da Segunda Guerra Mundial.
Certamente, abriu novas perspectivas para a música-de-igreja, não somente no Reino Unido, como também na maioria dos países, abrangendo todas as denominações protestantes e evangélicas.
O teólogo e crítico musical Erik Routley dizia, em meados do século 20 (ver: Church Music and Theology. Philadelphia, PA, USA: Fortress, 1959), que a busca pela beleza na música-de-igreja destrói a beleza sonora e a ortodoxia poética. Ele reconheceu que a HINOLGIA estava abrindo seu campo de estudo à curiosidade do público.
Concordamos que a intemperança no uso de hinos ainda pode ser observada nas congregações; que os hinos modernos (entre os quais sobressaem os cânticos – os chamados “corinhos”) são considerados “indispensáveis”, mas também são cantados sem entusiasmo. É preciso preservar a HINODIA e prestigiar a HINOLOGIA.
Suponho que os leitores deste sítio tenham mais conhecimento da HINODIA protestante e evangélica do que da católica.
Rolando de Nassau
Brasília, DF, em 15 de janeiro de 2023.
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