Joás Dias de Araújo (1938-2003)
Joás Dias de Araújo (1938-2003)
Texto lido por Késia de Araújo Seignemartin, (filha do Rev. Joás), por ocasião de seu 60° aniversário em 1998 em Americana-SP e complementado em 2003 após a partida do Rev. Joás ao encontro de nosso Pai celestial.
Na primeira carta do apóstolo Paulo aos Tessalonicenses, ele diz: “Em tudo dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco ” é por esse motivo – AÇÕES DE GRAÇA – que“… quero trazer a memória o que pode dar esperança….”
Reverendo Professor Joás Dias de Araújo, meu pai, nasceu na quente cidade de Cuiabá, no dia 11 de abril de 1938. Seu pai foi o rev. Augusto José de Araújo, pernambucano, pastor presbiteriano, de temperamento calmo e conciliador e querido por tantos quantos foram suas ovelhas. Dele dizia o rev. Júlio Andrade Ferreira: – O Augusto… nasceu no Pernambuco, casou-se no Mato Grosso, estudou em São Paulo, foi pastor na Bahia e agora está aposentado em Goiás.
Sua mãe; a nossa querida Vó Raquel, era bem baixinha, dinâmica, gostava de cantar; era uma ótima contralto e fazia dueto na Igreja com meu pai quando ele ainda era bem pequeno. Foi mãe de uma grande família, pois, teve 7 filhos: Josias; Jonas; João; Joel, faleceu na infância. Evelina; Joás e Joarib. Não posso deixar de mencionar aqui, OTÍLIA, uma moça que foi morar com a família e que com seu amor e carinho ajudou a criar os filhos mais novos como uma mãe.
Dentro desta grande família, meu pai cresceu. Foi menino cheio de saúde, levado, arteiro…
Como passou a infância numa chácara em Cuiabá, tinha tudo que era bicho: papagaio, cachorro, ovelha, cavalo, cabra, passarinho, que gostava de caçar e colocar em gaiolas que ele mesmo fazia. Andava sempre de cabeça raspada para a mãe não perceber o cabelo molhado, porque tinha ido nadar numa lagoa perto de casa, o que estava proibido pelos pais. Minha vó o chamava de meu pretinho e ele gostava de ir à feira vender chuchu para sua mãe . Já morando na Bahía, acompanhou seu pai numa viajem missionária. Foi como “ajudante de tropeiro”, pois, os burros e mulas, eram o meio de transporte dos pastores do sertão baiano. Enquanto cavalgavam sob o sol quente iam cantando: COM O ROSTO ALEGRE VOU ANUNCIAR… enquanto isso; Deus trabalhava em seu coração, despertando nele a mesma vocação de seu pai .
Nas paradas, enquanto o cozinheiro fazia a comida, ele aproveitava para cuidar dos animais. Foi neste contexto que cresceu.
Em 1952 terminou a 4a. série ginasial. Gostava de escrever poesias e ler poetas brasileiros. Com 14 anos foi mandado para São Paulo, interno no Instituto José Manoel da Conceição, para fazer o Colegial que o prepararia para o Seminário. Lá seu apelido era baiano, pelo sotaque carregado que trazia dos anos que viveu com a família em Caetité na Bahia. Com o passar do tempo sua vocação esfriou e ele queria então ser advogado, prestar exame vestibular no “largo São Francisco” para fazer Advocacia, até que, numa pregação do Rev. Osvaldo Emerich, se rendeu completamente ao ouvir o hino de apêlo que dizia: “Poderei confiar em ti ???”…
Terminado o colegial, foi para o Seminário de Campinas. Estava com 18 anos; foi o aluno mais novo da turma de 56. Era magro, esportista, jogava volei, basquete, era artilheiro no futebol… continuava escrevendo suas poesias. Foi nesse período que escreveu O SEMINÁRIO, poema que se tornou celebre e ainda hoje retrata aquela casa de Profetas nos anos 60.
Enquanto fazia o Seminário, prestou o serviço militar em Campinas, e trabalhou com a nascente Congregação Presbiteriana do Jardim Guanabara, da qual, anos depois, tornou-se seu pastor, e que se reunia no próprio Seminário Presbiteriano, em Campinas.
Foi nessa época, , que começou a namorar Josefina, que era membro da Igreja do Jardim Guanabara. Nos 5 anos de Seminário, ele não se permitia tirar nota menor que 9. Namorava estudando grego e hebraico, pois, sempre no dia seguinte havia a possibilidade de uma prova. Em Dezembro de 60, termina seu bacharelado em Teologia e se casa, indo em seguida para Goiânia se apresentar ao Presbitério Sudoeste de Goiás, que o ordena, à 15 de janeiro de 1961, aos 22 anos de idade.
Agora, eram 2. Como pastor, ordenado e casado, foi pastorear a Igreja Presbiteriana de Herval Doeste, em Sta Catarina, numa Igreja que incluía pessoas que moravam também em Joaçaba, que ficava do outro lado do rio do Peixe e era formada por descendentes de Poloneses, russos, tchecos, alemães, italianos e alguns brasileiros. A língua falada na cidade era o alemão e o português e a pequena Igreja estava dividida em dois partidos políticos: UDN e PTB. Pastoreou essa Igreja e outras mais pela região, como seu pai, sempre viajando montado à cavalo ou de trem, ou de carona na carroceria de caminhões por 1 ano, quando então aceitou o desafio da Junta de Missões Estrangeiras para ir ser missionário, junto com minha mãe, na Venezuela.
Tiveram que esperar 5 meses, pois um nenê estava a caminho. Em maio de 62, depois do nascimento do Josué, partiram os 3 para a quentíssima cidade de Maracaibo, terra dos poços de petróleo da Venezuela.
O trabalho missionário foi pioneiro. O apartamento em que morávamos era também usado para todas as reuniões da Igreja nascente; exceto os Cultos e Escola Dominical, que eram realizados na “Christi Church”, na Av. Bella Vista.
Determinado, estabeleceu uma igreja com colombianos presbiterianos que estavam trabalhando na cidade. Falando “portunhol”, assumiu o trabalho que lhe foi entregue. Muitas almas se achegaram a Jesus, através de seu ministério dedicado e paciente. Além dos cultos nos domingos à tarde na Christ Church, organizou um congregação no bairro San José, na casa da família Gonçales e outra em La Pomôna, na casa da família Soares.
Com o termino de seu período missionário, voltou ao Brasil em novembro de 1965, coincidindo com a volta dos rev. Neftalí Vieira e família, e rev. Odair Oliveti e família que eram missionários no Chile.
No retorno ao Brasil, já éramos 4, pois Késia nasceu em Maracaibo, durante uma reunião do Presbitério que se reunia em nosso apartamento.
Quando descemos em Viracopos, Campinas; encontramos toda a Igreja do Jardim Guanabara, Campinas esperando… foi então que meu pai, ficou sabendo que havia sido eleito pastor daquela comunidade. Assim, no dia 23 janeiro de 66, só com 27 anos, tomou posse do pastorado da Igreja Presbiteriana do Jardim Guanabara, em Campinas, onde ele trabalhou como seminarista nos anos 1959 e 1960.
Entretanto a comunidade continuava nas dependências do Seminário, mas já tinha um terreno. Foi no seu pastorado e com a participação integral do Conselho da Igreja, que abriu e organizou 14 pontos de pregação e congregações, que hoje, Igrejas organizadas, estão aí para testemunhar o trabalho que foi realizado.
Liderou a construção do tão sonhado templo. É histórica naquela comunidade, “O DIA DA PASSAGEM”, 29 de setembro de 1968, dia esse em que todos os membros saíram do Seminário em caminhada até seu novo e definitivo lugar, construído à rua Barbosa da Cunha, 562, no Jardim Guanabara.
Até hoje, essa data é comemorada pela comunidade. Foi ainda no pastorado desta Igreja que nasceram Caleb e Augusto Neto.
Nos 14 anos que esteve como pastor em Campinas, também deu aulas no SEMINÁRIO PRESBITERIANO DO SUL, de Homilética, Hermenêutica , Exegese do Novo Testamento , Religiões Comparadas e Religiões no Brasil.. Foi presidente por várias vezes do Presbitério, e do Sínodo de Campinas.
No final de 1979, quando tinha então 41 anos, numa reunião do ainda Presbitério de Campinas, quando ainda Americana fazia parte deste Presbitério meu pai, foi procurado pelo Sr. Domingos Denucci, presbítero da Igreja de Americana, com o apêlo: “PASSE A MACEDONIA, E AJUDE-NOS, por UM ANO” !!! Esta comunidade ia ficar sem pastor, e precisava de alguém com suas características pastorais. Depois de orar só, e com família, resolver aceitar o desafio de deixar uma Igreja grande, dinâmica, em expansão, para recomeçar tudo numa comunidade que estava ficando sem pastor e com grandes problemas… Foi neste contexto que chegamos em Americana… Fazia muito calor naquele 28 de janeiro de 1980, não conhecíamos a cidade nem as pessoas da Igreja. Meu pai gostava de lembrar que no primeiro domingo que aqui passamos, viemos à Escola Dominical, entramos de mãos dadas com o pedido que Deus estivesse também segurando as mão de cada um de nós, dando-nos um espírito de humildade, trabalho, mansidão e amor para com o povo da Igreja.
Havia uma grande expectativa de ambas as partes. Neste ano de trabalho, deveriam ser feitas muitas reuniões, visitas, reorganizações, reconciliações, construções, encontros, etc… Foi um ano de descobertas de ambas as partes: novo pastor e nova Igreja…
De meu avô Augusto, recebeu uma carta que dizia: …que o novo pastorado, seja um estímulo para um consagrado ministério em Americana.
Terminou 1980 e o Conselho pediu que continuasse no pastorado. Os anos foram passando: 1981, 1982, 1990, 1992, 2000, até 28 de janeiro de 2003, quando em pleno ministério e professorado, foi chamado para descansar de suas dores na presença do Deus dos deuses e Senhor de senhores. Nosso Pai e criador. Louvado seja nosso Deus e Pai.
Paralelamente ao pastorado da IGREJA PRESBITERIANA CENTRAL DE AMERICANA, continuou a participar dos trabalhos conciliares da I P B, como secretário executivo do Presbitério; como Presidente do Presbitério; como Presidente do Sínodo. Foi organizador do 1o. ENCONTRO DE CASAIS COM CRISTO, desta Igreja em 1984.
Foi candidato à presidência do Supremo Concilio da Igreja Presbiteriana do Brasil em 1986. Começou a fazer pós-graduação em Homilética em São Paulo; Sofreu um enfarte agudo do miocádio em 1988; foi promovido pela primeira vez à avô, em 1989, com a chegada do Guilherme. Depois de tudo isso, ainda conseguiu terminar seu mestrado em Homilética em 1992. Foi presidente do Conselho de Pastores de Americana, por várias vezes. Presidente do Centro Brasileiro de Estudos Pastorais, o CEBEP, e como tal, participou como delegado em 1995, da ASSEMBLÉIA do CONSELHO LATINO AMERICANO DE IGREJAS, no Chile. Hoje é presidente de honra. Pelo CEBEP, ainda como presidente, participou de reuniões na: Costa Rica, Porto Rico, Guatemala, México . Desde 1997, é o coordenador Nacional, da I.P.B. para o PLANO MISSIONÁRIO COOPERATIVO, que tem como meta “plantar 300 novos templos-escola”, até a ano 2.001 no território brasileiro. Faz parte da Comissão da IPB, que trabalha a reaproximação das IGREJA PRESBITERIANA do BRASIL e IGREJA PRESBITERIANA INDEPENDENTE. Com todas essas atividades extras e com o crescimento desta comunidade, foi preciso ajuda e assim recebeu o reforço do rev. Ailton Gonçalves Dias Filho . Há anos dá aulas de Homilética, todas às quintas-feiras no Seminário Presbiteriano do Sul, em Campinas… onde também faz parte do Conselho Editorial da Revista Teológica, e até no ano passado, fez parte do Conselho Diretor da SPS. como representante dos professores do Seminário. Tem sido incansável estudioso da Bíblia, que prega com convicção e firmeza. Com todas essas atividades continua, há 18 anos consecutivos sendo pastor desta Igreja… Neste tempo, quantos ele casou? quantos viu nascer ? quantos batizou? De quantos fez a profissão de fé? quantos já partiram? quantos ouviu o choro e aconselhou ? quantos acudiu? quantos visitou ? com quantos ele chorou por uma perda! ou com quantos deu graças a Deus por uma vitória? e com quantos orou agradecendo os anos de vida, ou de casamento ? quantos abençoou ? 1998 completa – 60 anos. Como pastor, sem dúvida, uma de suas maiores alegrias é estar aqui na casa deste Senhor ao qual um dia ele resolveu dedicar toda sua vida…
Minha mãe, meus irmãos, eu e demais parentes aqui presentes, podemos testemunhar que meu pai tem pés bonitos, pois ele é um dos homens que o profeta Isaías falou no cap. 52:7 “ Quão formosos são sobre os montes os pés dos que anunciam as boas novas, que faz ouvir a paz, que anuncia cousas boas, que faz ouvir a salvação, que diz: O teu Deus reina!”.
Homenagem de Josefina Maria Araujo e filhos Josué, Késia, Caleb e Augusto
© 2003 da Família Araújo – Usado com Permissão
Publicado originalmente em: http://ipjg.org.br/pastores-curriculo/JoasDiasAraujo.htm
O hino “Nas Mãos de Deus”, de Norah Buyers (1919-2013), teve estrofes adicionais (2.ª e 3.ª) escritas por Joás Dias de Araújo.
Joás Dias de Araújo – In Memoriam
Gostaria de me expressar em nome do Centro Brasileiro de Estudos Pastorais (CEBEP).
Quando digo Cebep, não me refiro a uma instituição à qual o Rev. Joás serviu como colaborador, membro da assembleia, da diretoria e, reiteradas vezes, como Presidente. Refiro-me, antes, a uma nuvem de testemunhas espalhadas por todo o Brasil e América Latina, gente com rosto, mãos e pés que aprenderam a respeitar, admirar e a amar o Rev. Joás. E, ao que parece, a recíproca era verdadeira, porque nos sentíamos profundamente amados por ele.
O Rev. Joás representa a encarnação do nosso projeto, pois o Cebep é um centro de estudos pastorais, cujo objetivo é mais do que unir, é “aunar” estudo e pastorado. O Rev. Joás percebeu, como poucos, que para ser pastor não basta ter sido, um dia, estudante, mas que é preciso tornar-se um estudioso permanente da teologia. O labor do estudante se encerra com a formatura, a do estudioso se estende por toda a vida. Para o estudioso não há formatura, há, porém, na melhor das hipóteses, transformatura. E hoje estamos concelebrando a plena transformatura do nosso querido Joás.
Isso não significa que seja para ele o fim das pesquisas. Pela leitura do Apocalipse aprendemos que no Céu também há livros – alguns servem até para se comer… Eu não me surpreenderia se, podendo dar uma expiada, surpreendêssemos o Rev. Joás, amante dos livros como era, debruçado, examinando o Livro da Vida, ainda fechado para nós, mas aberto definitivamente para ele.
Ao Rev. Joás a nossa saudade, homenagem e gratidão por ter-lhe sido companheiro e discípulo. Aos seus queridos, àqueles e àquelas que mais sentirão sua falta, porque o amaram mais, o nosso carinho, a nossa oração e uma palavra de consolação — para o que, por já me faltarem as minhas, empresto as do salmista:
SENHOR, não é soberbo o meu coração,
nem altivo o meu olhar;
não ando à procura de grandes coisas,
nem de coisas maravilhosas demais para mim.
Pelo contrário, fiz calar e sossegar a minha alma;
como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe,
como essa criança é a minha alma para comigo.
Espera, ó Israel, no SENHOR, desde agora e para sempre. (Sl 131)
Luiz Carlos Ramos
© 2003 de Luiz Carlos Ramos – Usado com permissão
Publicado originalmente em: “http://www.luizcarlosramos.net/rev-joas-dias-de-araujo/”
Parabéns Robson pelo excelente trabalho para e Hinologia Cristã . Este trabalho sobre a biografia e poesia do nosso tio, Rev. Joás Dias de Araújo vai ficar nos anais das Igrejas Reformas(Presbiteriana) do nosso Brasil. Deus abençoe, Presbitero João Dias de Araújo Filho
O rev Joás é um dos preciosos fundadores da minha amada Igreja Presbiteriana de Paulínia.
Amado pastor, alegre, encorajador. Num sermão na nossa igreja, disse: “esta não pode ser uma igreja do ‘já fez’!”. Homem de Deus.