Hinódia Wesleyana – Simei Monteiro
Hinódia Wesleyana*
“Extraído do Anuário Litúrgico, no ano 2007, páginas 42 a 43, publicado pela Editeo – Editora da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista/Universidade Metodista de São Paulo. Reprodução autorizada”
Qual a contribuição dos Wesley para o acervo de hinos e cânticos da Igreja Cristã? Na segunda metade do século 18, João Wesley surge como importante figura na hinódia inglesa. Ele traduziu cânticos[1], foi também editor e distribuidor, o que foi muito importante para a divulgação dessa nova hinódia. Enquanto esteve na Geórgia como missionário, compilou uma coleção de salmos e hinos (A Collection of Psalms and Hymns, 1737)[2]. Essa coleção era bem variada, composta de traduções, salmos métricos e poesia devocional de autores ingleses. Podemos dizer que houve, naquela época, um estilo wesleyano de canto eclesiástico. Sabemos que ele se preocupou não só com o que se cantava nas igrejas, mas também como se cantava. Na sua obra “Hinos Seletos”, de 1761, ele introduz as “orientações para o canto” (Directions for Singing, VII), as quais, na verdade, são questionamentos sobre o modo como se canta nos cultos.
Estas sete orientações foram impressas no “Anexo de Hinos Seletos com Melodias” (Select Hymns with Tunes Annext, 1761) e demonstram qual deve ser o interesse e o modo de cantar de uma congregação.
Essas orientações, em resumo, eram as seguintes:
1) aprenda bem as melodias
2) cante-as exatamente como estão escritas;
3) cante tudo (não pare no meio do canto);
4) cante entusiasticamente;
5) cante modestamente;
6) cante no tempo (não atrase nem se adiante ao canto dos demais);
7) cante espiritualmente.
Na Geórgia, John Wesley não só iniciou seus 50 anos de editor de textos e hinários, mas também, seu interesse e prática do canto congregacional, fez com que introduzisse um novo princípio na prática do culto: “cantar o que prega e pregar o que se canta”. É esse o princípio norteador da música litúrgica, que já discutimos em outros artigos, o qual coloca a música no culto como a verdadeira música sacra, a qual não é a música de um lugar, cultura ou época, mas a que tem função litúrgica. Por isso John Wesley interessou-se em colecionar melodias cantáveis e, ainda na Geórgia, começou a publicá-las. Seu primeiro livro de melodias data de 1742 (Foundery Collection) e seu último, de 1780 (Sacred Harmony). Seu trabalho foi desafiado pela enorme produção de seu irmão Carlos Wesley, que possivelmente escreveu cerca de 6500 cânticos (alguns autores afirmam serem cerca de 9000). As melodias dessas coleções eram tão variadas quanto às métricas de Carlos Wesley. Algumas eram melodias inspiradas ou adaptadas de cantos folclóricos[3], melodias provenientes de óperas italianas ou cantatas, tanto religiosas como seculares. Na prática do culto metodista, essas melodias tinham acompanhamento instrumental variado: solo acompanhado de viola e basso contínuo, ou cravo. Também, na prática, surge a figura do líder do canto congregacional, que ensinava e dirigia os cantos.
A hinódia wesleyana, principalmente os hinos de Carlos Wesley, é bastante ampla. Um sumário de temas abordados nesta hinódia incluiria: a graça preveniente, justificadora, santificadora e perfeita de Deus. Temas como convite à conversão, arrependimento, perdão, segurança, novo nascimento, santidade pessoal, santidade social. Hinos sobre a Igreja: unidade e comunhão e santa ceia; além de hinos apropriados às estações do ano cristão, como Natal e Páscoa. A hinódia wesleyana produziu tanto os chamados hinos evangelísticos como hinos de caráter mais devocional ou introspectivo que narram a experiência cristã da conversão e do caminho da perfeição cristã. Alguns chegam mesmo a ser expressões comoventes e, para alguns estudiosos, exageradas, isto é, expressões do ser humano maravilhado diante do amor divino.
A substância da teologia wesleyana não se fundamenta em uma ordem sistemática de crença, mas essencialmente nas 64 coleções que os irmãos Wesley publicaram entre 1738 e 1785. É lamentável que nós metodistas não tenhamos acesso substancial a esse acervo tão importante. Muito pouco da poesia wesleyana foi traduzida para o português. Precisamos conhecer mais esses textos que nos surpreendem pela atualidade, pois além dos temas clássicos da teologia, nos falam de nossa responsabilidade social, inclusive com a ecologia.
Muitos poemas de Carlos Wesley falam de problemas que a humanidade tem sofrido constantemente. Eis como se inicia um de seus poemas que descreve o horror da guerra e que, ao final, aponta para o triunfo do Reino de Deus: “Lamentamos ver, agora, nossa Terra” (Our Earth we now lament to see): Lamentamos ver, agora, nossa Terra com torrentes de maldade; com violência, erro e crueldade; um campo de sangue que se expande, onde pessoas diabólicas se devoram em toda a infernal fúria da guerra.[4]
Notas:
* Mosaico – Apoio Pastoral – Maio/Junho 1994 -p.3
[1] Principalmente do movimento pietista-moraviano
[2] O Hinário Evangélico apresenta a melodia Savannah como de autoria de João Wesley e publicado na Foundery Collection em 1742. A palavra Savannah possivelmente indica, como era de praxe entre os compositores, o lugar onde foi composta (Hinário Evangélico n.º 177). O novo hinário metodista norte-americano não atribui essa melodia a João Wesley, mas cita a fonte.
[3] Um bom exemplo dessa adaptação é a melodia Aberystwyth (v. Hinário Evangélico, 362, 3.ª música) de origem celta.
[4] In The United Methodist Hymnal n.º 449, Nashville, 1994. The United Methodist Publishing House. Tradução Teológica Bíblica.
Artigo publicado no CD “Charles Wesley – 300 anos”, de Carlos Eduardo Vieira e Luiz Otávio Pereira do Carmo
© 2007 de Simei Monteiro – Usado com permissão