HCC 077 – Luz da minha alma
História
77. Luz da minha alma
No dia 25 de novembro de 1820, John Keble escreveu uma poesia de 14 estrofes de adoração e petição ao Filho de Deus. Baseou-a em Lucas 24.29:
“Eles, porém, o constrangeram, dizendo: Fica conosco; porque é tarde, e já declinou o dia. E entrou para ficar com eles.”
Keble publicou a poesia, com o nome Evening (Noite), no seu famoso livro The christian year (O ano cristão), em 1827. Este livro, do qual todos os hinos de Keble foram extraídos, teve 95 edições durante a sua vida. “Sinceramente piedoso e estimulante à consciência religiosa”,1 também representou, no seu estilo, o espírito romântico prevalescente na primeira parte do séc.19.
John Keble (1792-1866), preparado para a universidade por seu pai, homem de grande cultura, no seu lar pastoral, entrou em Oxford como bolsista aos 14 anos. Provou sua erudição ao receber inúmeras honras. Ordenado ao ministério anglicano aos 24 anos, teve uma carreira brilhante. Keble pastoreou diversas igrejas e foi professor de poesia na Universidade de Oxford por alguns anos. Escreveu muito, mas a sua fama vem mais por seu livro The christian year. O hinólogo John Julian, que considerou os hinos de Keble entre os melhores e mais populares da língua inglesa, cita o famoso poeta, Sir John Coleridge, em seu dicionário de hinologia:
O ano cristão é maravilhosamente bíblico. A mente de Keble era, através de estudo prolongado, paciente e afetuoso das escrituras, tão permeada por elas, que a sua linguagem, sua linha de pensamento, seu modo de raciocinar parecem fluir na poesia [de Keble].2
Editores de todas as denominações pediram permissão para fazer seleções das poesias deste livro para os seus hinários, e sempre receberam um alegre “sim” deste escritor muito modesto.
Keble foi um dos líderes do Movimento Oxford, na Inglaterra. Adornou as suas idéias, ganhas do seu pai, com o seu caráter de pureza, bondade e doçura. Expressou-as na sua poesia e ensinou-as aos seus discípulos com muito fervor.
Em 1836 Keble aceitou o pastorado na pequena cidade de Hursley, continuando alí até a sua morte, trinta anos mais tarde. Publicou em 1839 sua Metrical version of the psalms (Versão metrificada dos salmos), e Lyra innocentium (Lira dos inocentes), com o subtítulo Pensamentos em poesia sobre crianças cristãs, em 1847. Keble, com a “mente de um erudito de uma cultura refinada”, continuou a publicar muitos outros livros e folhetos sob os mais variados assuntos durante toda a sua vida.
No livro Famous hymns of the world (Hinos famosos do mundo), o escritor Allan Sutherland conta uma história comovente de como o cantar deste hino salvou muitas vidas:
Numa noite tempestuosa uma heróica nau foi ao pique. Conseguiram colocar poucas mulheres e crianças num barco salva-vidas, sem remos ou vela, flutuando à deriva, a mercê das ondas. Mais cedo, ao entardecer, homens corajosos na beira do mar haviam percebido o perigo da nau e saído na tempestade, desejando salvar vidas. Mas, nem puderam achar a nau. Depois de muita busca sem sucesso, iam voltar para a praia quando, acima do gemido da tempestade, ouviram a voz pura de uma mulher cantando:
Luz da minha alma és tu, Senhor;
noite não há se perto estás.
Dissipa as nuvens do temor,
e tenho em ti descanso e paz.
Conseguiram salvar aquelas vidas, mas se não tivessem ouvido o cântico de fé daquela senhora, com toda a probabilidade, aquelas pessoas teriam perecido antes do amanhecer.3
A tradução de Luz da minha alma foi feita peloDr. João Gomes da Rocha, dedicado médico missionário e hinólogo, em 1898. O hino de cinco estrofes foi publicado na terceira edição do hinário Psalmos e hymnos com músicas sacras em 1899, edição pela qual ele era inteiramente responsável. No Hinário para o culto cristão foram usadas as duas primeiras estrofes da tradução de Dr. Rocha. (Ver dados biográficos do Dr. Rocha no HCC 2)
João Wilson Faustini descreve a ocasião da sua tradução das estrofes 3 a 5:
Embora eu já conhecesse o texto português de J.G. Rocha, quando fui adaptá-lo na peça coral Antífona da dedicação e Sun of my soul (Luz da minha alma). de Warren Martin, verifiquei que, a partir da terceira estrofe, quase nada havia das idéias de John Keble. As estrofes 3 a 5 foram traduzidas então por mim.4
Esta forma da tradução do hino foi usada no culto de ação de graças da formatura de Faustini do Curso de canto e canto orfeônico pela Escola Paulista de Música, em 1963. Foi publicada em São Paulo no seu hinário bilíngüe, Seja louvado, em 1972.
A compositora Joan Larie Sutton nos dá a história da composição da música do hino em 1970:
Já tínhamos outra tradução deste hino, no CC 284, com a música tradicional (HURSLEY) para ele usada. Esta tradução, muito melhor, nos pedia outra música. Usamos a letra como exercício de composição em aula, no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, surgindo esta música. O nome da melodia LUZ provém da letra.5
1. BAILEY, Albert Edward. The gospel in hymns. New York: Charles Scribner’s Sons, 1950. p.162.
2. JULIAN, John, ed. A dictionary of hymnology. v.1, Dover Edition, New York: Dover Publications, 1957. p.612.
3. SUTHERLAND, Allan. Famous Hymns of the World. Em: PRICE, Carl F. One hundred and one hymn stories. Nashville, TN: Abingdon Press, 1966. p.81.
4. FAUSTINI, João Wilson. Carta à autora em 23 de abril de 1991.
5. SUTTON, Joan Larie. Carta à autora em outubro de 1991.