A Música de Igreja com Ritmos Populares – Rolando de Nassau

(Dedicado ao leitor Almir Ramos, do Rio de Janeiro, RJ)

Na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos da América, nas igrejas litúrgicas (anglicanas e católicas, principalmente), os jovens de 1930 continuaram cantando o repertório de seus antepassados, talvez o existente desde o tempo da Reforma. Na década de 60, a Igreja Anglicana e a Igreja Católica começaram a admitir ritmos e instrumentos da música popular em seus cultos e em suas missas.

No Brasil, as igrejas do chamado movimento de renovação espiritual, que eclodiu entre os Batistas, também na década de 60, tinham uma obsessão doutrinária. Pouco preocupadas com seu estilo musical, as igrejas “renovadas” permaneceram, durante mais de 20 anos, no uso do “Cantor Cristão”.

Surgidas na década de 80, as igrejas neopentecostais tinham uma ênfase diferente. Apoiando a “Contemporary Christian Music” que alguns evangélicos dos Estados Unidos da América usavam desde a década de 70, elas passaram a divulgar música com ritmos populares, então chamada de música “gospel”. Este termo foi escolhido por uma questão de “marketing” (Denise Cordeiro de Souza Frederico. Cantos para o Culto Cristão, pp. 242-245. São Leopoldo, RS: Editora Sinodal, 2001). O termo não deve ser confundido com o autêntico estilo “gospel” dos negros norte-americanos (OJB, 03 jun 2002, p. 4).

Ao pressentir e perceber a insatisfação de parte da membrezia com a execução musical, limitada ao canto de salmos e hinos, adotaram estratégias de “marketing”, visando interesses subjetivos e individualistas. Queriam satisfazer principalmente os adolescentes e os jovens das igrejas neopentecostais.

Intencional e objetivamente, tomaram medidas práticas para a formação de um mercado para a nova música no Brasil. Essa música, por meio de discos e espetáculos, penetrou nas igrejas tradicionais, inclusive afetando a identidade denominacional de cada uma delas.

Com letra religiosa, essa música utiliza elementos, instrumentos e estilos da música profana popular. Com efeito, é um aperfeiçoamento técnico dos “corinhos” norte-americanos (década de 50), difundidos pelas igrejas pentecostais e por grupos extra-denominacionais, mas tolerados pelos dirigentes de igrejas batistas.

Na verdade, era o produto da mercantilização do Evangelho. Sua produção significou que certa Igreja, ao tentar satisfazer os gostos e desejos de seus membros e simpatizantes, acabou por se submeter às leis do mercado musical, chegando mesmo a ser também uma mercadoria religiosa. No mundo capitalista, o Mercado exerce com desfaçatez sua força sobre a Religião.

Em 2003, numa revista batista, alguém escreveu que fora do “marketing” não haveria salvação para a música de igreja. Talvez a articulista estivesse acolhendo o mau exemplo daquela igreja neopentecostal (OJB, 07 set 2003, p. 4).

Nas décadas de 70 e 80, a JUERP tinha produzido música, que não despertara eficientemente o interesse do público para o seu consumo. Era tarefa a exigir muitos recursos financeiros. Ela deveria ter oferecido música adequada, antes que o culto batista, na década de 90, viesse a sofrer mudanças no seu ambiente próprio.

Neste mesmo semanário denominacional, na virada do século, foram publicadas advertências, por causa das ameaças da nova música à pureza das práticas do culto batista (OJB, 03 jan, 15 mai, 07 ago, 11 set, 04 dez 2000; 02 abr, 16 jul e 17 set 2001).

Quando a nova música foi adotada, na década de 90, por certa igreja neopentecostal, nela ainda havia descontentes, não somente com a sua execução, mas também com a sua elaboração; eles queriam que fosse ainda mais popular …

Em 1997 previmos (OJB, 06 jan, 24 fev e 17 mar 97) que, naquela igreja, o culto seria oportunidade para entretenimento. Os jovens pretenderam até, no ano de  2000, participar do “Rock in Rio”. Predissemos que, afinal, a música de culto seria substituída pela música de entretenimento. Foi o que, infelizmente, aconteceu!

Para concretizar-se a substituição, foram tomadas as seguintes medidas:

  1. abandono da salmodia e da hinodia no canto congregacional;
  2. não questionamento em relação aos gostos musicais;
  3. atração às atividades da Igreja de músicos de “rock” e estilos afins;
  4. concessão de liberdade aos músicos para compor e executar, dentro do templo e durante o culto, sob a influência de qualquer espécie de música profana;
  5. criação de um estilo musical que teria preferência nas atividades da Igreja;
  6. concessão da liberdade para levar esse estilo aos locais profanos (salas de espetáculos, estádios, ginásios, auditórios, logradouros públicos etc.), em eventos musicais (“shows”, festivais, marchas etc.), com propósito evangelístico ou de propaganda da Igreja;
  7. capacitação e profissionalização de cantores e instrumentistas para eventual apresentação, mediante remuneração, naqueles locais e eventos;
  8. criação de entidades autônomas para a produção e difusão da nova música(editoras, livrarias, bandas, gravadoras, emissoras de rádio e televisão, sites na Internet) e promoção de eventos (empresários e agentes de publicidade comercial) com a finalidade de divulgação da música patenteada pela Igreja, simultaneamente com a propaganda institucional da Igreja e de seus líderes na mídia impressa e eletrônica;
  9. execução da nova música nas reuniões para entretenimento de adolescentes e jovens, realizadas no templo ou em clubes, lanchonetes, restaurantes, boates, casas noturnas, danceterias, logradouros públicos etc.;
  10. o novo estilo de música não seria associado ao termo “evangélico”;
  11. objetivação dos resultados esperados pela liderança da comunidade, com o emprego sistemático da música de igreja com ritmos populares nas atividades globais da Igreja:
  12. introdução da nova música de igreja no mercado da música popular, em termos competitivos.

É o caso de perguntar, consideradas as origens, se interessa às igrejas batistas arcar com as tremendas consequências da adoção da música com ritmos populares ?!

Rolando de Nassau

– x –

(Publicado em “O Jornal Batista”, 01 mai 2011, p. 14)..
Doc. JB-758
© Rolando de Nassau  – Usado com permissão

Você pode gostar...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *