HCC 138 – Vinde vós, fiéis, cantar

História

138. Vinde vós, fiéis, cantar

DA PENA de João Damasceno, o mais importante hinista dos primeiros séculos, esta é a primeira ode para o primeiro domingo depois da Páscoa da Igreja Oriental. Odes (ou cânticos) eram cantadas geralmente em grupos de oito nas casas monásticas daquela igreja. João Damasceno elaborou os seus cânticos especialmente sobre os temas da encarnação e ressurreição.

O ilustre hinista inglês, John Mason Neale1 adaptou muitos deles, trazendo-os à hinódia moderna com grande dificuldade, por causa da sua forma bem diferente de poesia e métrica. Neale publicou este hino num artigo sobre a hinódia grega em abril de 1859 e, depois, no seu hinário Hymns of the eastern church (Hinos da igreja oriental) em 1862. A comissão do célebre hinário anglicano Hymns ancient and modern (Hinos antigos e modernos), de 1909, preservou duas das estrofes de Neale, adicionando uma doxologia como terceira estrofe. Aparentemente, foi esta a versão traduzida para o português em 1960.

João de Damasco (ou Damasceno), nascido em Damasco no séc.8 (a.C.700-780), numa família de projeção, foi um erudito teólogo e hinista. Estudou com o instruído Cosmas, que a tradição declara ter sido comprado do mercado de escravos pelo pai de João.

João teve uma posição de destaque em Damasco, seguindo os passos do seu pai. Entretanto, quando envolveu-se na controvérsia iconoclástica, despojou-se de todos os seus bens e retirou-se ao mosteiro do Mar Saba, esculpido em um rochedo suspenso por cima do ribeiro Cidron, entre Jerusalém e o Mar Morto. Lá, São João Damasceno, como foi chamado pelas igrejas gregas e latinas que o estimaram muito e dele derivaram muito da sua teologia, passou seu tempo escrevendo obras teológicas e hinísticas.

“Sua afamada Doutrina da igreja grega até hoje é padrão para a igreja oriental”.2 

O seu tratado mais famoso foi As fontes do conhecimento. Neale o considerou

“o maior poeta da igreja grega”.3

O pr. Antônio de Campos Gonçalves, que adaptou este lindo hino para o português, nasceu em Araras, São Paulo, em 1899. Estudou em Piracicaba e Juiz de Fora, diplomando-se pela Escola Normal em 1918 e pelo Seminário Metodista.

Aos 16 anos o rev. Gonçalves iniciou-se na poesia, escrevendo para O juvenil, publicação para crianças atualmente representada pelo Bem-te-vi. Fundou a revista Cruz de Malta, hoje órgão oficial da Sociedade Metodista de Jovens. Colaborou no Expositor cristão, órgão oficial da Igreja Metodista e, ao longo dos anos, emprestou sua pena a quase todos os jornais e periódicos evangélicos da nossa Pátria.

Alto, magro, sempre bem arrumado, revelando homem de fino gosto, andar firme e olhar profundo, maneiras singelas e cativantes, este é o perfil de Antônio de Campos Gonçalves, o vernaculista de escol.4

Ilustre ministro da Igreja Metodista do Brasil, o rev. Gonçalves pastoreou grandes e pequenas igrejas no interior dos Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Serviu à sua denominação como Secretário Executivo da Comissão de Literatura da Confederação Evangélica do Brasil.

Campos Gonçalves

“serviu à Sociedade Bíblica do Brasil por 34 anos como revisor do vernáculo nas edições da SBB e secretário da Comissão Permanente de Revisão e Consulta”.5 

Nesta capacidade, atuou como coordenador da Comissão Revisora do texto de Almeida.

Continuando este trabalho até sua morte, copiou a tradução da Bíblia à mão várias vezes,

“sem faltar um só versículo. (…) ‘Dedicação, perfeição e gosto’ era o lema que lhe disciplinava as atividades na Sociedade Bíblica. (…) Mestre da língua pátria, na Comissão Permanente de Revisão e Consulta, sua voz nunca foi contestada. A última palavra em matéria do vernáculo era a dele”.6 

Ainda houve seu trabalho minucioso na revisão da Concordância Bíblica. Também revisou Bíblias completas, desde a Antiga Versão Brasileira, passando por todos os textos de Almeida e chegando à Linguagem de Hoje: milhares de páginas, bilhões de linhas tipográficas. O suficiente para derrubar gigantes e especialistas. Gonçalves foi as duas coisas, humildemente.7 

O rev. Gonçalves figura entre os grandes nomes da hinologia brasileira. O segredo do ministério dos seus hinos foi descrito por seu colega na SBB:

É poeta e sonhador. Quando sofre (vi-o chorando várias vezes; chorando e trabalhando) escreve páginas de consolo para os outros. Quando chora, metrifica letras de hinos, traduzindo alegrias do céu em mistérios de fé. Sofre, consolando. Chora, minorando prantos. É profeta.8 

É autor de hinos oficiais para igrejas, escolas, grupos e instituições. Foi membro atuante da Comissão do Hinário evangélico, do início em 1935 ao final em outubro de 1961, e contribuiu com dezenove textos para o hinário.

“Os hinos da sua lavra revelam a piedade pessoal de que era possuído e a inteira confiança em Deus”.9 

Mais de 33 textos de hinos seus figuram nos hinários e coletâneas evangélicos do Brasil.

“Seus trabalhos atestam o valor da sua contribuição”.10 

O Hinário para o culto cristão inclui, além deste texto, as letras dos hinos 283 e 420 deste operoso servo de Deus, que veio a falecer em 14 de janeiro de 1981, dez dias antes de completar 82 anos.

O internacionalmente conhecido compositor Sir Arthur Seymour Sullivan é famoso especialmente por causa da sua parceria com Sir W.S. Gilbert numa série de operetas de renome,

“que se tornaram uma parte da vida e tradição inglesa”.11 

Ainda hoje, não se passa um ano em que ao menos uma destas operetas não seja apresentada na Inglaterra, e muitas vezes, em outras partes do mundo.

Sullivan nasceu em 13 de maio de 1842, em Londres, Inglaterra. Aos doze anos tornou-se corista da Capela Real, e aos quinze, publicou sua primeira peça coral. Estudou na Academia Real de Música em Londres e no Conservatório de Leipzig, na Alemanha. Serviu como organista em diversas igrejas e, em 1866, tornou-se professor de Composição da Academia Real de Música. Além das suas operetas melodiosas, escreveu muitos peças corais, melodias para hinos, oratórios e cantatas. Editou o hinário Church hymns (Hinos da Igreja) em 1874 e contribuiu com melodias para outros hinários. Muitas das suas melodias aparecem em hinários evangélicos no Brasil. O muito cantado solo O acorde perdido é da sua autoria.

Sir Arthur era fortemente contrário ao uso de música popular para hinos. Embora melodias das suas operetas estivessem nos lábios de quase todos os ingleses, recusou muitos pedidos para adaptá-las para hinos. O Hinário para o culto cristão inclui mais duas das suas lindas melodias, nos hinos 340 e 586.

Foi conferido a Sir Arthur o grau de Doutor em música (honoris causa) pela Universidade Cambridge, em 1876 e pela de Oxford em 1879. Foi designado Cavalheiro pela Rainha Vitória, em 1883. Faleceu em 22 de novembro de 1900, em Westminster, Londres, e sepultado com muitas honrarias.

A melodia ST. KEVIN, composta para este texto, apareceu em 1872. Posteriormente, o compositor deu-lhe este nome em homenagem a um eremita irlandês que vivia no Vale of glendalough (Vale de duas lagoas) na Irlanda.

1. “Deve-se ao rev. John Mason Neale a revelação e aproveitamento, no ocidente, do vasto tesouro hinológico grego e latino. Profundo conhecedor dos usos e costumes da igreja oriental, (…) seu volume de traduções do grego representa doze anos (1850-1862) de trabalho árduo e perserverante.” [Embora pobre e de saúde precária, nunca procurou receber direitos autorais de qualquer uma das suas produções.] – BRAGA, Henriqueta Rosa Fernandes. Amorável convite, Ultimato, ANO XIII, n.128, abril/1980, Música sacra, pp.15-16.

2. BRAGA, Ibid.

3. Ibid.

4. ÁVILA, Ivan Espínola de. Mestre Campos Gonçalves, Obrigado! A Bíblia no Brasil. Rio de Janeiro: Sociedade Bíblica do Brasil, n.124, abr/jun, 1976. p.7.

5. Honra ao mérito – Rev. Prof. Antônio de Campos Gonçalves, A Bíblia no Brasil. Brasília, DF: Sociedade Bíblica do Brasil, n.124, jul/set, 1982. p.7.

6. ALVES, Ewaldo. Quando o rev. Antônio Campos Gonçalves se retirou da SBB. A Bíblia no Brasil. Brasília: DF, n.118, jan/mar, 1981. pp.1,2.

7. ÁVILA, Ivan Espínola de. Loc. cit.

8. ÁVILA. Ibid.

9. ALVES, Ewaldo. Op.cit., p.1.

10. REAM, Ethel Dawsey, Nossos hinos, a sua história. Rio de Janeiro: Escola de Música Sacra, 1951. p.74.

11. REYNOLDS, William J. Companion to Baptist hymnal. Nashville, TN: Broadman Press, 1976. p.439.

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