Eudaldo Silva Lima (1909-1988)
Eudaldo Silva Lima (1909-1988)
Nenhum cristão se retirou, jamais, impune dos sermões de Eudaldo Silva Lima (1909 – 1988), nome insculpido e imortalizado no coração de sem-número de presbiterianos nos quatro cantos do Brasil. Eudaldo trocou a dimensão terrena pela vida eterna há quase cinco lustros. Um ano depois estaria octogenário.
Como tribuno evangélico, de que o presbiterianismo nacional se envaidece, Eudaldo teve a estatura de um Galdino Moreira, de um Álvaro Reis, de um Jerônimo Gueiros, de um Matatias dos Santos, de um Miguel Rizzo, de um Basílio Catalá de Castro (seu pastor, amigo e incentivador para o ministério). Possuía o dom de extrair dos textos bíblicos ensinamentos que eram verdadeiros achados nas esferas espirituais e que não passaram desapercebidos às mentes esclarecidas e privilegiadas.
A seu respeito não se esgotarão epítetos: excepcional inteligência, colossal memória, largueza de alma, inesgotável capacidade de serviço, argumentador nutrido nos textos sagrados, na cultura teológica, na literatura, no conhecimento universal, no labor cotidiano, agraciado pela Divindade com a vocação para o ministério da palavra sagrada, espírito originalíssimo de autêntico missionário, capacidade de envolver-se com os mais aflitos problemas da alma humana, talento multifário…
As assertivas não pecam pelo exagero.
No múnus de educar, fundou escolas, ministrou ensinamentos nos vários campos do saber, foi decano do Conselho de Educação do Distrito Federal, tendo presidido a Câmara de Planejamento e a Comissão de Encargos Educacionais. Estudioso, adquiriu profunda cultura nas áreas da Teologia Sistemática e Pastoral, acrescida de curso de especialização nos EUA. A Assembleia Geral de sua igreja, unanimemente, o elegeu pastor emérito.
Escritor, conferencista, orador, tradutor, memorialista, professor, ficcionista, poeta, ensaísta, pensador religioso, missionário evangélico, humanista, imperturbável exegeta das Sagradas Escrituras, produziu Eudaldo variada literatura. Possuía o condão do narrador, senhor de invejável pureza de linguagem, estilo enxutíssimo, fluente, isso tudo conjugado com infatigável riqueza de conteúdo.
Legou-nos, ao entrar na cidade pelas portas douradas para gozo da plenitude da presença de Jesus (é dele a metáfora), as seguintes obras: Martinho Lutero ( escorço biográfico em comemoração do quingentésimo aniversário do monge reformador), traduzido do alemão pelo próprio Eudaldo; Escravos da Serra (romance garimpeiro); Cantigas de Fim de Safra (poemas); Cenas e Perfis na Parábola do Filho Pródigo (Sermões); Romeiros do Meu Caminho (saudades de um pastor do sertão – memórias); A Presença de Deus Face às Criaturas Humanas (Sermões); Os Régis da Quixaba (memórias) e Razões de Minha Fé (Obra apologética).
Eudaldo foi a um tempo orador e pregador. Como orador teve a eloquência das palavras. Como pregador usufruiu da unção do Espírito. Como orador possuiu verve. Como pregador, carisma. Era um iluminado. Como poucos dignitários evangélicos, sabia conversar com o auditório de modo franco, naturalmente. Doutrinava e convencia, levando ouvintes a rir ou a chorar. Sua voz, invariavelmente aquecida, era oriunda de um coração temperado nas labaredas da fé, como observou um de sues críticos.
O Pedagogo
Veio Eudaldo ao mundo em 21 de abril de 1909, no Distrito de Alto Bonito, Município de Mundo Novo, Bahia, filho de Apolônio Silva Lima e Lucinda Guimarães da Silva. Estudou na escola particular de D. Zizinha, da primeira à quarta série e um ano na Escola Caixeral do professor Pedro Góes. Fez o curso secundário na Escola Normal Missionária, em Ponte Nova (hoje Wagner), e o pré-teológico no “José Manoel da Conceição”, o Mackenzie, em São Paulo. O teológico, completou-o na Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana do Brasil, em Campinas, São Paulo. Frequentou, nos EUA, curso de especialização em Teologia Pastoral.
Foi pastor da Igreja Presbiteriana de Campo Formoso durante 11 anos. Nesta “pequena e inolvidável cidade “, fundou um Ginásio e Escola Normal, denominados Colégio Augusto Galvão, denominação dada em homenagem a ilustre filho da terra, entusiasta da Educação. Pela antiga UDN, foi eleito vereador, tornou-se presidente da Câmara Municipal, de 1945 a 1949. Ao instalar-se a Comarca, em 1943, foi nomeado Prefeito interinamente e serviu por teres anos como Oficial do Registro de Imóveis.
Em Salvador, foi pastor da Igreja Presbiteriana da Bahia, na Rua da Mangueira, bairro de Nazaré, de 1950 a 1960, quando tomou posse de novos encargos na Capital Federal, Brasília.
Ministrou aulas de Latim e Português nos colégios Estadual da Bahia (Central) e Dois de Julho. Na administração do prefeito Hélio Machado, foi diretor do Patrimônio da Prefeitura por quatro anos. Na gestão de Heitor Dias, dois anos diretor da Divisão da Secretaria do Bem-Estar Social.
Distrito Federal
Eudaldo desembarcou em Brasília precisamente no dia da inauguração da nova capital brasileira, em 21 de abril de 1961 ( dia também de seu aniversário ), para reunião especial da Executiva do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil e com a incumbência de ali fundar e construir a Igreja Nacional de Brasília. Assentou no Planalto Central os alicerces da nova ação evangélica, terminando por inaugurar o Instituto Presbiteriano de Brasília e o Sínodo do Brasil Central. Elegeram-no membro do primeiro grupo de professores secundários que inaugurou a Escola Elefante Branco. Em 1965 é nomeado membro do Conselho de Educação do Distrito Federal, cargo a que foi reconduzido por três mandatos de seis anos cada. Em 1983, Eudaldo é indicado pela Secretaria da Educação e designado pelo então governador José Ornelas para integrar grupo de nove pessoas com vistas a preparar os atos constitutivos do Conselho de Entorpecentes do Distrito Federal. Nesta mesma oportunidade foi agraciado com menção honrosa, tendo sido saudado pelo então presidente da Câmara Federal, deputado Rômulo Galvão, que fora seu aluno na primeira turma do Colégio Augusto Galvão, fundado por Eudaldo, em Campo Formoso. Foi eleito membro da Academia de Letras e Música do Brasil, em Brasília, na qual ocupou a Cadeira nº.18, da qual é patrono e poeta Cruz e Souza
Ainda em Brasília, Eudaldo Lima implantou a Igreja Reformada de tradição presbiteriana, sua figura tornou-se respeitada nos meios culturais e religiosos. Teve acatada a palavra não só como homem de fé e princípios, senão também como possuidor de vasta cultura humanística, específica de suas convicções. Pregador festejado, educador de méritos, militou anos e anos nas lides jornalísticas secular e evangélica.
O modo raro de dirigir-se às mais diversificadas plateias, o dom e graça singularíssimos de pregador, a veemência como dava trato às cousas sagradas, fê-lo conhecido e solicitado nos mais longínquos quadrantes do Brasil. Na Bahia, sua fama de predicante enveredou pelas trilhas da lenda e do folclore. Histórias continuam a correr de boca em boca, nas zonas rural e urbana, relatando episódios pitorescos do pregador eloquente, corajudo e imaginoso, do polemista destemido, do poeta e escritor de talento. Pedro Saturnino de Souza, (já falecido), que viveu em Campo Formoso , ex-faiscador do cristal de rocha, ex-presbítero, lembrava de inúmeros casos envolvendo a ação missionária itinerante de Eudaldo, numa jurisdição evangélica imensa como um país. Eudaldo, contava Saturnino, num determinado sermão comparou certos crentes às andorinhas que fazem verão acocoradas nos fios através dos quais fluem mensagens em Código Morese, sem nada perceberem do que está ocorrendo a seus pés.
Aos 70 anos (em 1979), Eudaldo desabafou: “A vida que agora vivo, vivo-a na saudade da gente, dos vales, dos panoramas, dos canários, das vozes, das cantigas, das alegrias desfrutadas”. E mais: “Que saudades me dá dos embiruçus em floração cobrindo a floresta escura de flores amarelas, ou das barrigudas ao fim de julho na florescência rósea que promete a lanugem macia da paina branca; que saudade me dá das viagens ao romper do dia, a brisa matutina roçando-me a fronte ao trote da montaria e na companhia daquele Santo que se chamou Joaquim Benício; que saudade de contemplar em qualquer manhã de novembro os umbuzeiros em flor, alvos como se chuva de neve lhes granizasse a ramaria, e aquele perfume enchendo o espaço e o zumbido de um milhão de abelhas furtando-lhes o néctar; que saudades que me vêm das tardes do sertão ao despertar nos sítios e fazendas dos irmãos, as casas simples, ao redor do mugido das vacas, o balido do gado unido e o aroma das boninas abençoando o ambiente da querência; que saudades agridoce dos encontros nos cultos celebrados nas roças, quantas vezes à sombra rotunda dos umbuzeiros sombrios (…); quanta saudade que nesse entretempo eu sofria da família distante, a filha morena de olhos indagadores, o filho pequeno fugindo de casa para a casa dos colegas pela rua sem perigos e, respondendo perguntas, explicava: “Estou fugindo para a casa do Rev. Newman, e da esposa solícita fazendo as vezes de pastora quando eu distante atendia s populações tão desprotegidas da zona rural”.
Eudaldo Silva Lima é uma inapagável falta no púlpito, na família presbiteriana, na sociedade evangélica, na cultura nacional, em todos os sítios por onde passou, cantando e espalhando suas orações que a todos surpreendia e embevecia e persuadia. Dele se poderá dizer o que foi dito de Abel: “Depois de morto, ainda fala” (Hebreus 11:4 ).
Euzébio Cardozo Neto
© 2015 de Euzébio Cardozo Neto – Usado com permissão
Nota: A respeito de “Um Hino ao Senhor”, atribuído à Matatias Gomes dos Santos, nos conta o neto de Eudaldo Silva Lima, Marco Maurício Lima:
“Matatias mudou os versos “as aves alegres balceam” por as “aves alegres na mata” e outras palavrinhas pra adequar melhor ao gosto do Sul. Mas meu avô não quis ficar como autor da poesia modificada, então, na primeira edição do Hinário Evangélico ficou como autor desconhecido e depois como de coautoria de Matatias.
Não cheguei a conhce-lo pessoalmente, pela literatura. O meu tio Maestro Levino Ferreira de Alcântara, fundador da ESCOLA DE MÚSICA DE BRASILIA, costumava me falar sobre o Rev Eudaldo Silva, com tanta admiração, aue aprendi a gostar dele apartir daquelas conversas. Não vou a velórios, a não ser que a pessoa tenha grande significado para mim. em #8 anos de Brasilia fui a 3, ao do pediatra de minhas filhas, ao di de um amigo querido e ao do Pr Eudaldo, que só conheci por seus escritos e de ouvir falar.
Distinta Lucia de F. Felix, gostei bastante do seu comentário sobre o Rev. Eudaldo Silva Lima. Se por acaso alguém ler meu comentário, gostaria de saber se alguém que foi ao sepultamento do Rev. Eudaldo Lima, por acaso, existe alguma fotografia?
Att,
Euzébio.